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Uma greve na fábrica de confetes

O menino gostava de carnaval. É claro que todos os meninos gostam, mas esse gostava muito mais. E ele gostava de tudo: de pensar numa fantasia, de estar com sua turma na hora da festa e dos confetes. Aliás, é preciso saber, o menino gostava muito, muito mesmo, dos confetes. Talvez mais do que do próprio carnaval. E seus confetes duravam o ano todo. Era só manter bem escondidinho o pacote, guardado a sete chaves para fazer seu carnaval sempre que dava vontade. Era por isso que ninguém entendia quando ficava horas trancado no quarto, sozinho. Coisas de menino, lá escondido, pulando seu carnaval solitário.

O carnaval mesmo já começava para ele quando começava a pensar na fantasia. Aliás, ele nem pensava muito, gostava mesmo era daquelas fantasias improvisadas, daquelas que a gente sai juntando as coisas mais esquisitas do guarda-roupas até montar um personagem para representar. Sua mãe até insistia para lhe fazer uma fantasia (costureira que era) ou ir a uma loja escolher uma pronta, mas para ele não tinha a menor graça. Eram mesmo muito engraçados os tipos de personagem que ele criava, enquanto misturava as peças do guarda-roupas. E disso não abria mão. Mas gostava de ir à loja para comprar os confetes.

Naquele carnaval, estranhamente, não tinha confetes à venda na loja. Nem na barraca da feira no sábado, nem na cidade vizinha. A fábrica de confetes tinha entrado em greve. O menino nem quis saber o que era uma greve, queria mesmo era seu carnaval como em todos os anos. A mãe ainda insistia: “Tem serpentina! Não serve?” (serpentina sempre sobra de outros carnavais). Coisa mais sem-graça é serpentina, pensava o menino, e depois nem dá para enrolar de novo, continuava ele. Confete, não, confete não é assim. A gente usa, junta tudo e usa de novo e pronto: dura o tempo que a gente quiser (ah, o tempo tão eterno da infância, Menino!). Era por isso que ninguém entendia o menino agachado no chão, catando todo ano os confetes no carnaval.

Chegou em casa ansioso e se dirigiu logo ao seu quarto e, no compartimento secreto de seu guarda- roupas, procurou o saquinho de confetes que havia guardado do carnaval passado. Não estava lá. Judite, a faxineira, deve ter descoberto seu segredo tão bem guardado, pensava. Procurou Ruth (seu amor ainda mais secreto que o compartimento secreto de seu guarda-roupas) e pediu a ela para emprestar um pouco dos seus confetes. Mas Ruth não entendia essa coisa de emprestar confetes. Ela não pensava como o menino: “Eu também estou sem confetes, e além do mais confetes a gente usa e pronto, é igual comida, não dá para emprestar.” (Ela não era uma praticante da arte de guardar confetes e de fazer carnavais secretos a qualquer época do ano.) Foi assim que o menino se desiludiu com seu primeiro amor. Era uma vez o amor... Um amor que ele achou que iria durar a vida inteira, como os confetes, que deveriam ser guardados a sete chaves.

E foi também assim o seu primeiro carnaval sem confetes e sem pensar mais em Ruth. Vestiu uma fantasia de fantasma, improvisada com um velho lençol branco e foi para a festa. Contentou-se em catar os confetes dos outros, maquinados com perfurador, e brincar assim mesmo. Mas ele gostou, gostou de verdade. Agora ele já sabia que tinha um problema a resolver: foi para casa com dois sacos de estoque de confete aproveitado (de perfurador mesmo, serve!), e guardou-os. Mas fez um outro compartimento ainda mais secreto no maleiro de seu guarda-roupa. Ninguém nunca desconfiou de nada, só Judite, que encontrou, meses depois, uma única bolinha de confete solta no chão do quarto.

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